Você
acorda todos os dias para lutar por sua vida. Enfrenta o mesmo mundo
que eu e na medida do possível tenta minimizar os riscos da hipocrisia,
do excesso de competitividade, das dificuldades impostas pelo
capitalismo e segue em frente, dia após dia, nessa luta incansável.
A
vida é muito valiosa. Seja você criança, adolescente, adulto, homem,
mulher, não importa. Também não importa a sua religião, sua cor,
condição social e seu time do coração. É um privilégio acordar todos os
dias, poder seguir em frente buscando os objetivos e isso tudo é
cansativo demais. Mas sempre buscamos força de onde não sabemos e
seguimos.
Eu
tenho meus objetivos particulares. Já vivi muita coisa e tenho certeza
que ainda não vi o suficiente. Perdi meu pai aos 14 anos e dei tanto
trabalho pra minha mãe que acabei me criando sozinho. Largado. Fui pai
aos 26 e comecei a entender que o pensamento individualista era o maior
dos erros em minha personalidade. Estou cheio de conta pra pagar,
ferrado de grana, muitas vezes recebo ofensas, meu ex-melhor amigo foi
um ingrato comigo e vi por um momento os meus sonhos indo por água
abaixo.
Quando
você chega ao fundo do poço, e sinceramente desejo a todos vocês que
isso nunca aconteça, você se torna uma criança de novo. Quer colo, uma
palavra de conforto, ajuda, alguém que passe a mão na sua cabeça. Algo
que não é novidade: não há pancada maior do que a vida te dá. Não há
crítica maior do que a auto avaliação. Não há lugar mais fácil de ficar
sozinho do que no mundo.
No
dia 23 de maio de 2012 acordei determinado a desistir de tudo.
Conversei com meu tio e disse que não tinha mais forças pra nada. Queria
que ele ajudasse a me encontrar uma solução. Estava completamente
perdido. Ouvi dele que precisava “nascer de novo” e parar com a auto
piedade.
Quando
você está em depressão, as coisas demoram a ser processadas. Algo
positivo precisa acontecer para que você dê uma acordada. E nesse dia,
sentando no sofá da casa de minha família no interior, chorei, gritei,
sofri, ri e chorei novamente quando Paulinho marcou o gol de cabeça
contra o Vasco da Gama.
A
adrenalina foi tão grande que passei a noite inteira escrevendo.
Escrevi para minha mãe, pra mãe da minha filha, pros meus tios, pra
minha namorada na época, no meu antigo blog e fiquei acordado sem
pestanejar até a noite de quinta. Tracei novas metas e criei uma linha
lógica na cabeça para seguir o meu caminho.
O
menino Kevin morreu. Com ele morreu parte da mãe, parte do pai, parte
da família e amigos. O povo boliviano sentiu, o San José sentiu e o
Corinthians sentiu. Tite chorou e a 2 metros de distância eu vi o quão
profundas foram suas lágrimas e o quão sincero ele foi ao dizer que
trocaria o título mundial pela vida do garoto. Vi quão dolorido estava
para Edu Gaspar falar de futebol ou mesmo dar explicações. Observei o
clima de velório da chegada do elenco ao hotel.
Jornalistas,
colunistas, blogueiros e torcedores mostram uma falsa indignação. Se
escondem atrás da sombra de um menino que faleceu vítima de um tiro de
sinalizador para cagar regra. Os autores, cúmplices, suposto menor
confesso e as cabeças pensantes por trás disso tudo, estão mais
preocupados com a própria pele do que com a gravidade do que aconteceu.
Que mundo é esse que vivemos onde tudo que se fala é em punição para o
Corinthians, em suposto laranja querendo assumir e pior, que mundo é
esse em que você torcedor de outro time, vem aqui neste espaço me chamar
de assassino? Quem você pensa que é?
Expus
parte da minha vida pessoal, inclusive coisas muito particulares, para
que você perceba que sou um ser humano comum, cheio de problemas, mas
cercado de sonhos e objetivos. E da mesma forma que eu sou assim, todos
nós somos. Kevin era. E muitos outros que nascerão, serão.
E
onde encontramos uma válvula de escape, um motivo pra desopilar todo
nosso stress, amigos que durante 90 minutos são extremamente
verdadeiros, onde as diferenças sociais somem, onde credos se somam e a
política é deixada de fora, pelo menos pra mim é no Estádio Paulo
Machado de Carvalho. Na maioria das vezes.
Quando
estou cansado, o Corinthians me cansa ainda mais mas me realiza
(ganhando ou perdendo). Quando estou pê da vida, o Corinthians me deixa
mais pê da vida ainda ou ameniza a situação. Quando estou triste, o
Corinthians me derruba de vez ou me devolve uma alegria que estava
perdida por alguma razão.
E isso eu aprendi com meu pai e ensino pra minha filha.
Pois
todos sabemos que abaixo do que temos de maior em nossa vida, nossos
pais, filhos, esposas, e para alguns está até acima disso, existe uma
coisa:
Corinthians minha vida, Corinthians minha história, Corinthians meu amor.
A
punição para o caso Kevin tem que ser criminal. Cadeia em quem cometeu o
crime. Se o Corinthians tiver que ser punido, a pena deve ser
administrativa.
Devolvam ao corinthiano o direito de incentivar seu time. Somos em grande maioria de paz. Bandidos existem em todas as torcidas.
E devemos nos unir para que estes, não frequentem mais estádios. Em nome de todos que queremos bem.
Mas
devolvam o nosso direito de torcer. Todos nós, bons torcedores,
queremos o direito de poder renascer após um gol inesquecível.
Fonte: Blog Ricardo Taves - Globo Esporte
Fonte: Blog Ricardo Taves - Globo Esporte